domingo, 27 de março de 2011

Um país de ilhas.

A verdade é que é muito mais fácil termos opinião sobre aquilo que nos rodeia do que aquilo que realmente somos, quando na verdade, uma coisa está completamente dependente da outra. Nunca conseguimos ter uma percepção verdadeira daquilo que nos rodeia, do mundo em que nos inserimos, senão soubermos exactamente quem somos.

Afinal, o que é "A Verdade"?
Quantas discussões já tivemos com alguém convencendo-nos que estamos certos - com a verdade - e que o outro não poderá estar a ser honesto? Quantas vezes nos convencemos ser donos e conhecedores da verdade? Quantas vezes não nos passou pela cabeça que o(s) outro(s) deverá(m) ter uma noção pervertida da realidade, ou pelo menos alterada, egoísta, por não ver a situação (seja ela qual for) pelos nossos olhos?
Quantas vezes não pensámos que o chefe só quer ficar com os louros, que o empregado da loja estava a abotoar-se com o troco, ou que deveríamos ter sido atendidos primeiro no café "afinal eu vou lá todos os dias!"? Este é um sentimento geral de incompreensão que nos toca a todos, em que nos vemos permanentemente preteridos e injustiçados, como se houvesse algum "complot" para nos lixar a cabeça.

O que esquecemos muitas vezes é que, como diz a sabedoria popular, há sempre "dois lados da mesma moeda", mas a verdade é que, por norma, há muito mais do que isso. Poderia dizer-se simplesmente "cada cabeça sua sentença", mas para todos os aspectos e acontecimentos do dia-a-dia. O problema é que ficamos por aí, como se fosse uma coisa normal desentendermo-nos permanentemente, cada um a cuidar e a lamentar-se de si, sem que ninguém se preocupe em fazer uma apreciação pelo todo.

De que outra forma podemos justificar o actual estado das coisas? De que outra forma podemos compreender que ninguém se entenda neste país, que todos olhem para o seu umbigo e não pretendam fazer nada para mudar a situação. Vêem aí eleições antecipadas, mas existe um sentimento geral de que "quem vier será igual ou pior". Afinal, em tempos de cortes, deveremos sempre cortar nos outros, pois os sacrifícios são para ser exigidos aos outros, a nós nada mais nos pode ser exigido.
Atenção, quando falo no "nós", falo em todo e qualquer um de nós, cidadãos portugueses, sem distinção. Pois não acredito que haja uma única pessoa que ache justo que lhes cortem o salário ou quaisquer regalias, da mesma forma que todos nós conseguimos identificar áreas onde os ditos sacrifícios seriam exigíveis, justos e adequados.
Afinal, aquilo que o governo fez (cortar a despesa em todo o lado, menos nos próprios governantes) é aquilo que reinvindicamos para nós próprios, nada mais. Será justo? Estará certo? Concerteza que não. Mas estaremos nós também a ser justos e correctos?
Quantas vezes já tomámos atitudes do género: "olhe que eu não preciso da factura para nada! Veja lá se não consegue que isso fique mais barato." É claro que aquela factura não nos vai ajudar em nada, pois não dá para descontar no IRS e ninguém quer saber se é emitida. É claro que me faz diferença pagar mais ou menos 23%, eu já pago impostos suficientes. Mas a verdade é que há os que pagam sempre, e esses são sempre prejudicados pelos que nunca pagam. Assim, acabamos por nos prejudicar a todos.
O que quero dizer é que, ao querermos olhar para o nosso umbigo, acabamos sempre por nos prejudicar.
Passamos metade das nossas vidas convencendo-nos de que somos umas ilhas, primeiro porque ninguém quer saber de nós, e vamos cavando à volta do pedacinho de terra que ocupamos para nos distanciarmos um pouco dos outros. E com aquela atitude de vitimização de que falei ao início, deitamos um pouco de água para o fosso que cavámos à nossa volta. Depois, com cada atitude egoísta, distanciamo-nos um pouco mais, colocamo-nos acima daquilo que consideramos ser a normalidade e elevamos a nossa ilha um pouquinho mais, de preferência tirando um pouco já da terra do vizinho. Ocasionalmente fazemos uma ponte, ou anexamos o terreno do vizinho, lutando por uma causa comum, vemos isso também nas manifestações que, como nos casamentos, dura enquanto durar, e mais cedo do que seria de esperar, acabamos por estar a cavar à nossa volta na esperança que isso nos destaque da multidão.
Pois tenho uma novidade, ao invés de nos estarmos destacar da multidão estamos apenas a uniformizar a paisagem: somos um país de pequenas ilhas, todo ele e sem excepção. Estamos a construir um país de náufragos que se recusam a ajudar uns aos outros e se assim continuarmos vamos-nos todos afogar lenta e gradualmente, rodeados de tantos outros.
A manifestação da "geração à rasca" deu-nos um outro tipo de paisagem, em que muitas pessoas sem nada em comum se juntaram, e por umas horas mudaram a percepção que tínhamos do país. Parecíamos um país unido por uma única causa. Espero que tenha consequências, que nos voltemos todos a juntar e não deixemos que tenha apenas a importância de um acto isolado, como tantos outros.
Vislumbro uma paisagem possível, em que cada náufrago utilizou a água que o separava para regar o terreno do vizinho e todos juntos voltámos a formar um país de uma terra só.
Isto é possível, mas depende de mim, de ti e de todos nós. Não depende dos outros.

sábado, 26 de março de 2011

quinta-feira, 24 de março de 2011

Optimismo!

 - Acho que estamos mesmo a precisar de um input positivo - 

Gosto mesmo de cá estar!
Desculpem todos, mas é verdade: gosto mesmo de cá estar!
Gosto de aprender (errar inclusive), gosto da alegria (com a tristeza a contrastar), gosto do mar, das árvores, de dançar.
Gosto da espontaneidade e pureza das crianças, da calma e sabedoria dos mais velhos, da "crueza" da relação que se cria com os animais, da proximidade que se pode criar com alguém desconhecido apenas em momentos.
Gosto de estar grávida, de amamentar e mudar fraldas, de ver o nascer e o pôr-do-sol , de me surpreender com as pessoas.
Gosto de ter saudades, de enfiar os dedos na terra, de ver uma planta crescer e de musica.
Gosto do barulho do mar, do som do vento a bater nas árvores, do burburinho de muita gente junta ao ar livre.
Gosto dos cuspidores de fogo, dos malabaristas e dos homens-estátua.
Gosto de comer, de cozinhar, de colher, de plantar.

Digam o que quiserem, gosto de viver!

quarta-feira, 23 de março de 2011

A Pedra e a Água

-Sobre a Crise-

            Estamos em crise, sim estamos. Estou eu, estás tu, está a vizinha do 1ºEsq. que perdeu o emprego e o Sr. Manel da oficina que já quase não tem clientes. Portugal também. A crise é política, financeira e até linguística - com o novo acordo ortográfico  ninguém se entende. Está a Europa e o Euro, o Norte de África com as revoluções, a Ásia assiste à recente catástrofe no Japão. O mundo está em crise, e eu também.
            Não posso mudar o mundo todo (nem sei bem o que faria se pudesse), pois o mundo são as pessoas e essas não gostam mesmo nada de mudanças. Não gostam de mudanças no emprego “que ninguém me dá valor”, nem de casa “é só caixotes - não me volto a meter noutra”, nem sequer do tempo “esta humidade dá-me cabo da artrite”. Como podemos mudar o mundo sem que as pessoas mudem? Simples: não podemos!
            Mesmo assim, somos sempre tentados a mudar os outros, afinal eles é que estão mal! “Eles é que se queixam da vida o tempo todo, só sabem olhar para o umbigo. E os políticos? São todos iguais, nem vale a pena votar. Este país está todo desgraçado... lá fora é que é bom, não admira que haja tanta emigração.”
            Pois é, mas “nós” somos os outros de alguém, assim como “eles” são os nossos outros. Difícil mesmo é admitir isto, admitir que se tivéssemos a vida do vizinho do lado, ao contrário do que queremos apregoar, não íamos ser mais felizes. Por uma razão muito simples, eu continuava a ser eu, tu continuavas a ser tu, e por mais que mudassem as circunstâncias à nossa volta, isso permaneceria imutável. A nossa pessoa, a nossa essência, não muda conforme o ambiente em que está, não muda conforme o que tem. Aliás, por norma, somos de tal forma casmurros que só mudamos algo em nós quando somos realmente obrigados a tal e mesmo assim com relutância. Isto acontece perante alguma forte adversidade da vida, um problema de saúde grave, a perda de alguém chegado ou mesmo uma crise generalizada.
            Quando tudo o que conhecemos, como conhecemos, deixa de fazer sentido. Quando o certo é tomado pelo incerto e na generalidade não fazemos a mais pequena ideia como as coisas estarão amanhã, ou no dia seguinte, somos forçados a pensar.
Ora bem, estava eu embrenhada nestes pensamentos e nas contradições que preenchem o meu dia-a-dia, a pensar porque é que numa altura em que o país precisa de se unir parece que parte tudo em debandada (os jovens qualificados emigram e vão apostar o futuro num país que não é deles, os partidos políticos em vez de se unirem em prol do bem comum, insistem em puxar cada um para o seu lado) quando percebi, de forma clara, o que se estava a passar.
            Acho que é do consenso comum que, quando acontece uma crise, é por que algo está mal, algo precisa de ser mudado, desesperadamente. A mudança necessária pode vir como uma onda suave, as pedras que se encontram à beira mar aceitam o seu movimento e deslocam-se seguindo as indicações da onda, formando um novo padrão, uma nova praia. Mas quando a resistência à mudança é grande, quando as pedras resistem em massa a sair do seu lugar, a natureza, de forma a cumprir os seus propósitos, vê-se obrigada a ser mais firme, impetuosa até. Assim estamos nós. Podemos ser a água que tudo muda e transforma, dando o nosso contributo para as mudanças necessárias, sugerindo, empurrando, evoluindo na nossa forma de ser, tentando transformar o pouco que nos é pedido e que nos rodeia. Ou podemos ser a pedra, pesada e impermeável, não permitindo qualquer alteração na nossa vida, encarando o movimento e as alterações à nossa volta com contrariedade, o chamado “ou vai ou racha” (por vezes racha).
             Mas há algo que não podemos fazer, de forma alguma. Não podemos querer ser a água comportando-nos como uma pedra. Não podemos querer mudar os outros sem nos mudarmos a nós próprios primeiro. A pedra não tem, nem nunca terá a fluidez e a ondulação da água, e estejamos certos: a pedra não desloca a água, apenas a água tem a capacidade de tirar a pedra do seu lugar de conforto.
            Tenho de fazer a pergunta: sou a pedra ou a água? Que faço eu no dia-a-dia que me classifique como um ou outro? Que posso eu fazer para ser a água? Que podemos fazer para mudar?
            Podemos tentar ver a nossa vida com outros olhos. Fazer opções diárias pela nossa felicidade, e não por aquilo que nos incutiram ser bom para nós. O nosso objectivo de vida é sermos felizes, certo? Então porque estou a tentar manter um emprego que me deixa infeliz? Devia estar a procurar outro tipo de oportunidades, fazer um plano (nem que seja a cinco anos) para alcançar aquilo que pretendo. Porque dispenso tanto tempo do meu dia a pensar em coisas que me aborrecem, me deixam triste e deprimida? Ao invés prometo que darei atenção a pelo menos 5 coisas por dia que me deixem feliz (1- hoje está sol; 2 - o sorriso dos meus filhos; 3 - o bolo de chocolate que comi (ou queria ter comido); 4 - a musica que não me sai da cabeça; 5 – as flores que comprei há 15 dias e ainda não murcharam). Porque tento agradar a pessoas de quem não gosto especialmente? Para compensar, hoje vou ligar a um amigo com quem já não falo a algum tempo. São pequenos os gestos que nos alteram o humor, a maneira de encarar a vida um dia de cada vez. Faço aqui o compromisso de traçar objectivos para cada um dos dias, tornando o “meu mundo” um pouco melhor irei, inevitavelmente e sem reparar, alterar um pouco também “o mundo” dos que me são mais próximos. Pouco a pouco faremos uma onda, uma suave onda de mudança. Pode ser que assim “a crise” nos passe um pouco mais ao lado, ou pelo menos não lhe demos a mesma importância....
            Mas sabem que mais? Aquilo que agora nos parece o fim do mundo, o próprio do Apocalipse, acontece todos os anos, ciclicamente. Todos os anos assistimos às marés vivas no final do verão, que limpam e transformam a geografia das praias, encurtando a sua extensão, tirando a areia e expondo o esqueleto das rochas, eliminando em grande parte todo aquele areal onde nos deliciámos, correndo e jogando à bola durante o verão. As ondas cavalgam para dentro de terra, atacam até as construções mais próximas fazendo estragos. Mas nem mesmo depois do inverno mais rigoroso ou das ondas mais fortes, independentemente dos avanços que o mar possa ter feito, deixou alguma vez de haver Verão!